ASSISTO constantemente aos velórios e sepultamentos, indistintamente, há muitas décadas.
Hábito que adquiri ainda jovem e o mantenho até hoje. Aprendi que se trata de uma obrigação cristã, que eu cultivo religiosamente.
EM RAZÃO disso, observo como os costumes sofreram e sofrem uma mutação constante. Entendo que tais mutações são consequências da aceleração brutal que atinge a vida humana como um todo.
FALAR dos velórios de hoje é um tanto desnecessário. Esses ocorrem com frequência quase diária numa cidade pequena como a nossa.
Quer numa funerária quer noutra o tratamento é quase uniforme. As despedidas fúnebres se revestem de tantas comodidades, em busca de minorar os sofrimentos dos parentes e a oferta de conforto aos convidados, que vão, desde locais de descanso, dormitórios e uma farta confeitaria, acompanhada de café, chá, leite e, dependendo do contratante, até sucos e refrigerantes.
As urnas mortuárias, que variam de preço na proporção do patrimônio do usuário, são transportadas em carros do ano, dirigidas por chauferes devidamente uniformizados e circunspectos, como convém o momento .
RETROAGINDO a um passado distante, sessenta anos ou mais, essas cerimônias eram bem diferentes.
Quanto ao conforto dos familiares e convidados, embora com muitas simplicidades, ofereciam locais para o cochilo, já que todos traziam consigo o necessário agasalho, sendo os velórios nas residências enlutadas.
Comida e bebida, era um farturao.
Assim que constatasse o óbito , capadao gordo, frangos, galinhas e, em alguns casos, até vaca gorda, caiam na faca, para saciar a fome da quantidade de gente que concorreria.
NO SEPULTAMENTO propriamente dito, as diferenças são enormes.
Os cemitérios, sempre localizados longe dos moradores. Tinha casos de até duas, três ou mais léguas distantes da residência do finado, em razão da preferência, ou onde foram sepultadas outros familiares.
COMO. NÃO contavam com automóveis, e não aceitavam o carro de boi, pois aqueles sacolejos e as bacadas secas do carro maneiro em estradas irregulares, judiava muito com o cadáver.
Era melhor o uso do BANGUE…
ESSA CERIMÔNIA fúnebre envolvendo o bangue, tenho absoluta certeza de que pouquíssimas pessoas de hoje tem ou teve conhecimento dela.
O BANGUE consiste numa peça de madeira composta por duas peças de madeira roliça, compridas, cerca de uns quatro metros de comprimento, travada por outras duas peças menores, que travam as duas peças maiores, numa medida de mais ou menos dois metros uma da outra. Assemelha-se a um andor. Com isso sobram mais ou menos quatro cabos de dois metros nas duas pontas.
Daí, entrelaçam em pequenas distância com laços de couro de boi, onde será colocado o caixão com o defunto.
AQUELE BANGUE é transportado nos ombros de quatro homens, que se revezam na medida em que vão suportando.
Evidentemente que são muitos os participantes desse cortejo, para que o revezamento seja no menor espaço de tempo possível.
Os baguezeiros, como são tratados, tem de serem experientes em manterem o ritmo e a cadência dos passos. Do contrário dificulta a permanência da madeira nos ombros de cada um.
E,assim, vão a passos apressados, quase iguais ao trotar dos animais, que sao montados por meninos, que também se revezam juntamente com os donos e imediatamente montam no outro cavalo que sobrou naquele revezamento.
TEM-SE A IMPRESSAO de que, sendo um serviço pesado, seria rejeitado. Ledo engano. Aquele ritual era cumprido num misto de obrigação e alegria
NO TROTEAR dos homens e dos cavalos., as léguas ficavam pequenas.,.
POR UMAS duas vezes participei de cortejos como esses..,