Marciano Borges de Melo-Advogado,Fazendeiro,Empresário / Comunicação e Escritor |
Como muitos nasci e me criei nesta terra abençoada por deus. Nela vivi a minha infância, adolescência, a fase adulta e aqui me casei, criei meus filhos e pretendo viver os anos que me restam.
Paralelamente a minha vida coincide com a vida civil da minha terra. No ano em que nasci, 1.944, vazante foi elevada a condição de distrito, desmembrando-se de guarda mor, a cujo distrito pertencíamos, e ambos faziam partes da cidade de Paracatu.
No dia 12 de dezembro do ano de 1.953, vazante foi elevada a condição de cidade, trazendo consigo o distrito de guarda mor, desmembrando-se de Paracatu.
A instalação do município deu-se no ano de 1.954, sendo nomeado intendente o advogado Paracatuense, Dr Antônio Ribeiro, que dentre outras providencias, convocou as primeiras eleições municipais, tendo sido eleito o senhor Waldemar Cavalcanti, mais conhecido como Glofo.
Como muitos, repito, pois existem muitas pessoas que, igual a mim, vivenciou esses belos tempos e são testemunhas vivas do inicio da vida da nossa cidade e poderão confirmar o que descreverei ao longo do meu relato, como poderão fornecer melhores subsídios e até mesmo discordar, pois me valerei quase tão somente da minha memoria.
A criação do município, cujos antecedentes serão explicitados, não transcorreu em perfeita harmonia, pois foi contestado veementemente pelos políticos e a população guarda-morense que, de certa forma tinham suas razões.
Para elevar um distrito a cidade, necessário se faz o preenchimento de determinadas condições, assim como um número mínimo de moradias, habitantes, locais apropriados para receber as repartições públicas, etc. somadas, é claro, a força política. Seguindo as orientações do deputado que representava vazante, o coronel Jose Vargas irmão de Quintino Vargas, líder político regional, os líderes vazantinos correram contra o tempo e forneceram ao deputado o último documento a esse fim.
Têm de enaltecer os valorosos homens que lutaram incansavelmente para verem vazante ser elevada a condição de município e ver a sede do distrito à categoria de cidade. O primeiro deles é o coronel Salatiel Valeriano Corrêa, que durante longos anos liderou a UDN Vazantina, participando ativamente da política do município de Paracatu, sempre presente nos importantes eventos daquela vetusta cidade. Em um dos pleitos municipais em que a disputa foi acirrada, o coronel Salatiel Corrêa teve participação decisiva, levando os votos necessários para tirar a frente do adversário e dar a vitória ao seu correligionário da UDN. Nessa oportunidade recebeu um pente de ouro para pentear as suas barbas – ele as usava abundantes e compridas .
Esse presente foi o contraponto oferecido, pois os adversários prometiam arrancar- lhe as barbas na enxada. Juntamente a esse grande líder estavam seus sobrinhos, Afrânio e Alírio Alves Rosa, Pedro Pereira Guimarães, os comerciantes, Ubaldinho Ferreira de Rezende, Oscar Gonçalves de Melo, Sebastião Rabelo Corrêa, escrivão de paz e notas, Waldemar Cavalcante-que seria o futuro prefeito- e outras pessoas que não me ocorre na lembrança.
Os políticos guarda-morenses também participavam do processo, porém com a intenção de levar a sede da cidade para Guarda-Mor. Eles tinham razão de pensar dessa forma, pois detinham em mãos, além de melhores condições urbanas, Guarda Mor continha muitas dezenas de moradia a mais do que em Vazante, tinha energia elétrica, agência dos correios e telégrafo. Tinha em mãos o maior dos trunfos o Governador do Estado era do PSD, que era maioria na sede daquele distrito; que tinha como representante o deputado Cândido Ulhôa do PSD.
Apesar de tudo isto quando foi publicado o decreto criando o município a sede ficou sendo em vazante.
Foi uma decepção geral. Não encontravam explicação. Era aguardado pelos guarda-morenses como certo que a sede séria em guarda mor, sem a mínima chance para os lapeiros, conforme éramos pejorativamente tratados.
Enquanto os vazantinos comemoravam a emancipação política do município, os guarda-morenses mordiam de raiva. Diante da tamanha decepção.
– onde será que arrumaram jeito para que assim terminasse esse processo emancipacionista???
Mas era o que constava na lei de 12 de dezembro de 1.953. Os distritos de Vazante e Guarda Mor desmembraria do município de Paracatu formando um novo município, o de vazante, era a realidade.
Mas como explicar? Com todos os trunfos na mão o doutor Candinho, como era chamado o deputado Cândido Ulhôa, que era pessedista, correligionário do Governador Juscelino Kubitschek, deixar o deputado cel. José Vargas passar-lhe a perna daquela maneira. Era de fato inexplicável.
Formaram comitiva e foram na capital em busca de explicações e, nada. Era fato consumado. Não tinha como voltar atrás.
À boca pequena diziam que tudo nasceu de uma barganha entre os deputados que formavam a comissão emancipacionista. O deputado José Vargas apoiaria a emancipação de certos municípios e em troca receberia votos suficientes em favor de Vazante. Para justificar juntou as certidões fornecidas pela prelazia de Paracatu demonstrando a quantidade de casamentos e batismos anuais que eram realizados em Vazante. -. A região toda casava e batizava seus filhos por ocasião da festa da lapa.. Foi o maior trunfo do deputado da UDN.
A comitiva de Guarda-morenses que foi recebida pelo governador trouxe uma promessa daquele politico sagaz que era JK : -ganhe a eleição de prefeito, que seria realizada ainda naquele ano, que eu levo a sede da cidade para Guarda Mor…foi a solução encontrada pelo governador.
Criou-se, pois, a maior expectativa para essas eleições, que foram realizadas em um clima de grande rivalidade entre as facções políticas dominantes à época. O PSD dos guarda-morenses contra a UDN dos lapeiros.
O prefaciador do meu ultimo livro, ” a nesga goiana ” o competente professor, Agenor Gonzaga, titular da cadeira de letras da Unipam (centro universitário de patos de minas), disse com muita propriedade ” qualquer um sabe contar uma viagem de Paracatu a lagamar, mas o difícil é relatar o que ocorreu no caminho”.
Muitas pessoas sabem que ocorreu a eleição para a escolha do primeiro prefeito de vazante mas poucos conhecem os fatos e acontecimentos que se deram dentro daquele pleito.
Como já relatado, os guarda-morenses tinham, por questão de honra, conseguir a sede do município, ganhar a qualquer custo aquelas eleições. Por outro lado, os vazantinos sabedores da promessa do governador, tinham de redobrarem para não perderem o status de cidade, mesmo porque já havia instalado a intendência, de onde o Dr. Antônio Ribeiro governava e presidia aquele importante pleito.
O processo eleitoral era jurisdicionado em Paracatu, sede da comarca; dali originavam as diretrizes e ordens judiciais que eram levadas pelo oficial, Cristiano Bezerra, que vencia todo tipo de dificuldade para cumprir as ordens do seu superior. Vencidas as etapas os candidatos tiveram seus nomes registrados e aptos a disputarem as eleições.
Do lado de guarda-mor não foi muito difícil a escolha. Do fazendeiro Jose Rezende, o Juca Mirote, recebeu o apoio quase unanime, pois vinha de família pessedista e tradicional, penetrando na região da macaúba, Bahia cachoeirinha, matos, pulador e com o apoio dos penas, Joaquim, Alírio, Enock trazendo o peso do Dr..Ermírio e outros pessedistas coromandelenses, fazendeiros na região da Macaúba.
O intendente, Dr..Antônio Ribeiro, que fora nomeado para o cargo como prova de decisão política, pois era um pessedista do pê rachado conforme diziam á época, tinha fortes aliados na região do canastra, onde era afazendado.
Diziam com toda certeza e sem medo de errar que essa tava no papo; era favas contadas. Do outro lado os udenistas tiveram dificuldades ate se alinharem a um nome de consenso.
O grande líder, Salatiel Corrêa, veio a falecer no dia 04 de dezembro de 1.953, poucos dias antes da edição da lei que deu vida ao recém criado município. Foi uma comoção generalizada deixando órfão o seu filho Antônio Valeriano Corrêa, além dos sobrinhos da família Rosa, que os tinham como pai. A esses coube dar sequência na condução política do município.
Era de fato um fardo enorme, mormente no que exigia o momento.
Os udenistas eram fortes e lutadores. Reuniram em torno de Afrânio Rosa, que tomou a seu cargo a liderança, homens como: seus irmãos. Primos, destacando Pedro Chico, óscar de Melo, farmacêutico com forte liderança, Ubaldino Rezende, comerciante, as famílias Corrêa, Guimarães, Alves, seu Dandico, lá na região da Macaúba. Somando – se também os Teixeira e a Família campos, todos udenistas da hora.
Não podia deixar de fora o nome de Waldemar Cavalcanti, o Glofo. Vindo da região dos folhados, em Patrocínio, a princípio como dentista prático, indo de fazenda em fazenda, tratando os dentes daquele povo tão afastado deste tipo de profissional, foi se fazendo conhecido, amado e respeitado por todos. Vendo uma região prospera e com grande chance de ser explorada comercialmente estabeleceu no ramo de compra e venda de mercadorias. Adquiriu um pequeno caminhão, no qual trazia as mercadorias para suprir o comércio local e adquirindo aquelas produzidas pelos fazendeiros. Esse intercâmbio fez dele uma pessoa extremamente popularizada, sem contar o seu carisma. Era querido por todos. As mulheres o adoravam.
Como nas famílias locais não despontavam um nome capaz de vencer aquelas importantes eleições, dois nomes foram postos. O do farmacêutico Oscar de melo e o do Glofo. O próprio concorrente, seu Oscar, como era tratado, opinou pelo nome do Glofo como o único com possibilidade de vencer as eleições, e para aumentar as chances buscaram em Guarda Mor o candidato a vice-prefeito, recaindo no sr. Horizontino Xavier, que gozava de um certo prestigio em guarda mor embora fosse um coromandelense.
Dessa forma as eleições se polarizaram. De um lado o PSD com o Juca Mirote e de outro a UDN com o Glofo.
Foi um embate terrível. Cada lado mostrando forças, fazendo comícios, buscando atrair adversários, tendo em seus quarteis uma demonstração. Visível de mais fartura. Os políticos de Paracatu e da capital se faziam presentes, prestigiando seus respectivos correligionários.
Chegou o grande dia. Foi um corre corre atrás dos eleitores, lembrando daqueles que ainda não tinham vindo. Poucas conduções,: estradas ruins. A hora vencendo…
As urnas vigiadas por fiscais de ambos os partidos até serem entregues no fórum em Paracatu.
Eu era uma criança nessa época. Ficamos de cá na expectativa do resultado, sem nenhum tipo de comunicação.
Quando a noite ouvimos lá na serrinha os primeiros foguetes espocando no ar, a pequena. Corrutela virou só fumaça. Recebemos o Glofo na maior festa. Venceu as eleições por apenas 05 votos de diferença.